Resenha: livro "O leitor do trem das 6h27", Jean-Paul Didierlaurent

 Olá pessoal, tudo bem? O primeiro post de março (2019 vai mesmo passar voando?) é uma resenha. Venho comentar sobre minha experiência de leitura com "O leitor do trem das 6h27", livro do francês Jean-Paul Didierlaurent, publicado no Brasil pela Editora Intrínseca em 2015.

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 Guylain Vignolles é um homem de 30 e poucos anos que mora sozinho com seu peixe de estimação e tem um trabalho que detesta. Suas distrações são as visitas a um ex-funcionário da empresa que se feriu na máquina que Guylain agora opera, as conversas com o responsável pela cancela de guarita do local onde trabalha que é apaixonado por obras clássicas, e suas leituras no trem.

 "Nunca uma palavra de boas-vindas, um gesto, nada, só esse sorriso cheio de arrogância que ele lhe dava do alto de seus vinte e cinco anos e de seu um metro e oitenta e cinco. Brunner passava o tempo disparando suas verdades a quem quisesse ouvi-las: os funcionários eram todos uns esquerdistas preguiçosos, a única utilidade das mulheres era servir o marido, ou seja, ocupar-se da cozinha de dia e engravidar à noite, os gnoules (abreviação do termo bougnoules, negros africanos, que ele vomitava mais do que pronunciava) passavam o dia comendo o pão dos franceses. Sem esquecer os cheios da grana, os RMistes, beneficiários de programas de inserção social, além dos politiquinhos corruptos, os motoristas barbeiros, os drogados, os veados, os veados drogados, os deficientes, as prostitutas. O sujeito tinha opinião sobre tudo, opiniões formadas que havia muito Guylain tentava não contrariar mais. Durante um tempo, usara a retórica, tentando explicar ao jovem que nada era tão simples, que entre o preto e o branco existia toda uma gama de tons, do cinza mais claro ao mais escuro. Em vão. Guylain acabara se acostumando com a ideia de que Brunner era um idiota irrecuperável. Irrecuperável e perigoso. (...) Brunner era uma cobra da pior espécie, pronta para picar ao menor passo em falso, e Guylain se esforçava incessantemente para manter distância, permanecer fora do alcance de suas presas." (páginas 21, 22 e 23; o tipo de gente com quem Guylain trabalhava)

 Guylain é empregado de uma fábrica que destrói livros! Aqueles títulos que ficam encalhados nas livrarias são enviados para serem triturados na máquina que Guylain opera e viram papel para outros livros. Algumas páginas escapam, e são essas páginas aleatórias que Guylain lê em voz alta todas as manhãs no trajeto de trem até o trabalho. Ele já ficou conhecido como "o leitor do trem das 6h27" pelos outros passageiros, e dois eventos o tirarão de sua letargia. O primeiro será um inusitado convite de duas senhoras, o segundo virá na forma de textos de autoria desconhecida que ele encontrará no vagão.

 "De segunda a sexta, Guylain se assoberbou de trabalho. Com o início do Salão do Livro de Paris, o fluxo de caminhões se intensificou consideravelmente. A época de muitos lançamentos, em setembro, e o período propício a prêmios literários existiam havia muito tempo. Era preciso abrir espaço nas livrarias, tirar as obras encalhadas das prateleiras. Os recém-chegados empurravam os mais antigos para a saída e recebiam a ajuda da lâmina da escavadeira." (página 75)

 Comprei "O leitor do trem das 6h27" por que era o que dava pra pagar com um vale na Black Friday de 2017. Comecei a leitura sem saber o que esperar, terminei com um sorriso no rosto e agradecia por ter dado uma chance à obra.

 A história começa parecendo melancólica e triste, com a vida solitária de Guylain e seu trabalho desagradável. Para quem, assim como eu, ama ler, é dolorosa a cena onde Guylain tem que acionar a máquina e destruir livros. É incômodo ver como alguns colegas de trabalho desprezam a leitura e não se importam por estar triturando livros. O fato de o papel ser reutilizado não traz muito consolo. Sentimentalismos à parte, infelizmente sabemos que as livrarias precisam de espaço para as novidades e nem sempre é possível encontrar leitores para todos os livros.

 Aos poucos, além do desagrado do protagonista com seu trabalho, vamos percebendo como a leitura das páginas que escapam do triturador é a válvula de escape de Guylain e uma espécie de momento terapêutico para os passageiros que viajam no mesmo trem. Sem perceber, Guylain se tornou alguém importante para eles, tanto que recebe o convite para ler para idosos, atividade que promove a convivência e debates entre os ouvintes.

 "Quando o trem parou na estação e as pessoas deixaram o vagão, um observador de fora teria conseguido sem esforço diferenciar os ouvintes de Guy lain dos demais passageiros. O semblante deles não exibia essa máscara de impassibilidade que execrava os outros. Todos apresentavam um arzinho feliz de infante satisfeito." (página 141, o poder da leitura de Guylain)

 PULE ESSE PARÁGRAFO SE NÃO QUISER SABER O QUE HÁ NOS TEXTOS ENCONTRADOS POR GUYLAIN NO VAGÃO! Mas é quando temos acesso aos textos que Guylain encontra no vagão que a história atinge seu ponto alto. Julie trabalha na limpeza dos banheiros de um shopping e escreve com muito humor sobre sua rotina, ela relata suas observações sobre as pessoas que encontra no dia-a-dia, relatos que vão mexer com Guylain, lhe dando um novo ânimo para a vida.

 "Veja bem, as pessoas aqui não se limitam a deixar o conteúdo de seus intestinos ou suas bexigas. Não é raro ver algumas delas virem se abrir comigo para descarregar os próprios males. Eu ouço as pessoas. Deixo-as esvaziar seu fel sobre o mundo, escorrer sua vidinha, me enrolar com seus problemas de todos os tipos. Elas se abrem, se queixam, choram, invejam, inventam. Tialogismo número doze: ‘Os sanitários são confessionários sem padre.’ Felizmente, há outros que vêm falar de qualquer assunto pelo simples prazer de trocar uma palavrinha gentil e para os quais sou algo além de duas orelhas onde despejar seu mal-estar." (página 139, Julie)

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 Eu não sei qual a ideia que a capa queria passar, mas prefiro as capas estrangeiras (a australiana ao lado, na minha opinião, é bem mais bonita e combina com a história). A revisão está boa, as páginas são amareladas. O livro tem um tamanho de bolso, a margem externa é pequena em relação às outras, as letras e o espaçamento tem um tamanho que foi confortável para a leitura.

 "Era bom constatar que existia outro mundo além do da STERN, um mundo onde os livros tinham direito de terminar a vida confortavelmente arrumados em caixas verdes ao longo dos parapeitos das margens, envelhecendo no ritmo do grande rio e sob a proteção das torres da Notre-Dame." (página 60)

 Confesso que pela capa, o título e os capítulos iniciais, eu imaginava uma história trágica, mas o que temos é uma trama que mostra o poder de união que a leitura tem, a capacidade que as histórias possuem de tocar e transformar os leitores, estimulando o debate, trazendo diversão, alegria e até um novo sentido para a vida. Jean-Paul Didierlaurent conseguiu me prender até a última página de sua história, me fazendo torcer muito por seus personagens cativantes. Foi uma leitura rápida que me surpreendeu positivamente, me despertou diferentes emoções, da tristeza ao riso, e que eu super recomendo, especialmente para os apaixonados por livros.

 Por hoje é só, espero que tenham gostado do post. Me contem: já leram ou querem ler esse livro?

 Detalhes: 176 páginas, ISBN-13: 9788580577914, Skoob. Clique para comprar na Amazon:




Até o próximo post!

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18 comentários

  1. Não conhecia o livro, mas adorei essa premissa e queria muito trabalhar nessa fábrica e me anima saber que finalizou a leitura com sorriso no rosto, quero ler só para saber o que tem nos textos encontrados no vagão. Sugestão anotada.

    Abraços.

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  2. acho que eu também lendo sua resenha tava esperando uma coisa bem triste, mas agora no final fiquei meio "O QUE?" em saber que não é tragica kkk
    Adorei a resenha, uma dica muito boa, faz tempo que não leio livros com essa tematica mais levinha assim, vou investir na leitura dele!!! <3

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  3. Olá, tudo bem? Já tinha visto esse livro diversas vezes por aí, porém não sabia muito bem sobre o que era a obra. Amei tua resenha e fiquei louca para ler o livro, parece ser maravilhoso.

    Beijos,
    Duas Livreiras

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  4. Amei o livro, adoro ler livros com temas mais melancólicos, e está história é muita poesia! Sua resenha está maravilhosa. ♡

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  5. Olá, não conhecia o livro mais gostei muito da sua resenha, acredito que daria uma chance a obra por ser uma leitura fluída e rápida, é disso que preciso nesse momento muita coisa da faculdade então os livros precisam ser nesse estilo, beijos!

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  6. Oiê,
    Não conhecia esse livro, mas confesso que depois de ler a sua opinião, fiquei muito curiosa por ele. Anotei a dica e espero ter a oportunidade de ler.
    Beijos!

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  7. Oi Mari.

    Ainda não tinha lido nada deste livro, por isso sua resenha foi uma surpresa e gostei bastante das informações que deixou sobre ele. Especialmente por saber que é uma leitura rápida e desperta várias emoções. Estou adicionando na minha lista de desejados.

    Bjos
    https://historiasexistemparaseremcontadas.blogspot.com/

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  8. Oi! Não conhecia o livro ou o autor, mas goste de saber sua opinião sobre ele. A edição é muito bonita. A ideia de uma leitura simples e fluida, mas que desperta sentimentos é legal, porque uma história não precisa ser grande e tensa demais para ser boa. Obrigada por compartilhar.

    Bjoxx ~ Aline ~ www.stalker-literaria.com ♥

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  9. Olá, tudo bem? Realmente, pela capa podemos esperar algo mais trágico, porém pelo que vi é algo completamente diferente. Por ser curtinho, e pelo fato do assunto tratado ser interessante, dica mais que anotada. Adorei saber que comprou ele por causa do cupom de desconto da BF HAHAHAHAHAH
    Beijos,
    http://diariasleituras.blogspot.com

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  10. Oiii Maria

    Ah que tudo quando a gente compra um livor às cegas e acaba se encantando e se surpreendendo, deve ser uma história bem envolvente, fiquei curiosa sobre o que ele lê que o ajuda a sair da letargia de todos os dias. Não conehcia o livro, achei a proposta diferente e bem poética, bacana.

    Beijos

    www.derepentenoultimolivro.com

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  11. Nossa, que livro mais interessante. Adorei a capa e o título, só por eles eu já fiquei curiosa, mas a sua resenha me permitiu conhecer um pouco sobre a trama e fiquei completamente interessada. Muito bom você ter dado uma chance à leitura e ter compartilhado sua opinião com a gente, espero que eu tenha a oportunidade de ler em breve.

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  12. Olá!
    Nossa, apesar de antigo, confesso para ti que não conhecia esse livro. Achei a premissa bem interessa e instigante ate, pois nunca li ate hoje nada que tornasse evidente o píer da leitura.

    Dica mais que anotada

    Beijos

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  13. Olá.

    Realmente, pela capa a gente não espera tantas coisas do livro, né? Mas gostei de saber como foi sua experiência de leitura e confesso que até me despertou interesse pela mesma. E sem dúvidas: o poder da leitura é maravilhoso! <3

    Beijos,
    Blog PS Amo Leitura

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  14. Caramba, esse é o tipo de história que amo, me remete ao existencialismo, mesmo não sendo, afinal, não li o livro, pela capa, também não daria bola, a estrangeira é bem melhor que a nacional que seguiu um estilo mais par ao comercial, mas o enredo, caramba. Filmes, livros, curtas que tragam esse tipo de experiência é sempre bem-vindo em minha casa, foi o livro que mais de identifiquei em seu blog.

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  15. P.S.: se enjoar do livro, estou aqui hahahahahah (é sério)

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  16. Não conhecia esse livro, mas ler sua opinião só me deixou curiosa. Com certeza pela capa eu não apostaria no livro, mas que bom que vc foi surpreendida positivamente pelo conteúdo do mesmo.
    Amei esse parágrafo: " ... uma trama que mostra o poder de união que a leitura tem, a capacidade que as histórias possuem de tocar e transformar os leitores, estimulando o debate, trazendo diversão, alegria e até um novo sentido para a vida" me convenceu com certeza 👏🏻👏🏻👏🏻👏🏻 😘😘😘😘

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  17. Eu não conhecia o livro e gostei bastante da proposta da história. As informações que você trouxe em sua resenha me despertou o interesse em saber mais.
    Bjim!
    Tammy

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